GERALDO SOUZA DIAS | LASCAS [SCRAPS] PAINTING AS {A FOREIGN} LANGUAGE

18.08 a 19.09 - Exposição: Lascas [scraps] Painting as {a foreign?} language
Individual de Geraldo Souza Dias
A mediação da pintura

Na tradição ocidental, identifica-se o formato da tela com um gênero da pintura: os retratos são realizados em telas verticais, enquanto as paisagens ocupam telas horizontais. A instalação Lascas, apresentada junto com outros trabalhos em “Lascas [Scraps] Painting as (a foreign?) language” de Geraldo Souza Dias, subverte essa convenção ao apresentar uma simultaneidade de perspectivas.

São 50 pinturas verticais realizadas sobre tábuas de madeira, dispostas lado a lado, formando uma paisagem, essa sim de apreensão horizontal, que ocupa três das paredes do espaço expositivo. Com esse procedimento, o artista desloca a visão aérea que normalmente temos do chão para um olhar frontal, reservado às paredes (e pinturas nela colocadas), ao mesmo tempo em que fragmenta a paisagem, supostamente contínua, em pequenos pedaços. 

Aqui, não há mais um ponto de vista privilegiado para a apreensão total da obra. Cada tábua é um fragmento que se constitui de maneira própria e demanda do espectador um olhar específico. Mas, tomadas em conjunto, acabam por mimetizar o skyline de grandes metrópoles, como São Paulo, no qual sobressaem os edifícios altos. O trabalho nos convida a um intenso vai-e-vem, um deslocamento ininterrupto. Sua apreensão exige que o espectador se movimente. Há, aqui, sem dúvida, algo da mesma ordem da experiência que temos com a cidade: uma espécie de condenação a uma visão parcial, na qual a totalidade impõe-se apenas com o prejuízo da compreensão de cada uma de suas partes. Porque cada lasca, ou cada fragmento, tem certa autonomia, mostra-se como totalidade acabada. 

As 50 peças são elaboradas a partir da colagem de diversos materiais (revistas, jornais, plantas de imóveis, propagandas impressas e histórias em quadrinhos) que aparecem parcialmente encobertos por uma pintura que mistura diferentes tintas, cores e técnicas. Como numa colagem cubista, o espaço da representação se vê interrompido por elementos da realidade. Em cada uma das pinturas, há um universo diferente, articulado por uma imagem (pintada ou colada sobre a madeira), uma frase, ou uma estrutura que organiza sua visualidade interna.  Estamos diante de trabalhos que demonstram uma frontalidade abrupta, planos sucessivos que rechaçam a perspectiva tridimensional e se recusam a acolher o olhar. Como os muros da cidade, cada pintura deixa entrever o que estava por trás, anteriormente, mas sem muita nitidez.

Nesses trabalhos a operação da pintura, propriamente, é reveladora. É ela que faz com que todas as presenças tenham o mesmo peso: uma frase retirada de uma propaganda, a obra de um artista reconhecido, uma ilustração. A pintura opera de forma ambígua, oculta detalhes dos recortes, mas deixa entrever sua origem distinta. Possibilita a convivência dos mais diversos elementos numa mesma tela. A ela é conferida uma espécie de poder que apazigua dissonâncias sem, contudo, apagá-las por completo.

Thais Rivitti