NEWMAN SCHUTZE | MORFOLOGIAS, DA LINHA AO MOVIMENTO
31.05.16 a 16.07.16 - Newman Schutze - Morfologias, da linha ao movimento
Quando acompanhamos o andamento de um julgamento, daqueles que não podem ser filmados ou fotografados, chegam-nos aquelas cenas de imagens de desenhos da sequência, ou possível sequência, do processo. São grandes os mestres do cinema, como Robert Joseph Flaherty (1884-1951, EUA) e Sergei Urusevsky (1908-1974, Rússia), que dão movimento às ideias e formas; formadores sequenciais de referências universais no cinema e que, consequentemente, contribuíram para que a categoria artes plásticas se diluísse em uma nova categoria: a das artes visuais (sem fazer apologia a correntes políticas com um sentido primordial de exclusão, para que o legado cultural e artístico prevaleça). Assim, Newman Schutze enaltece e revela, com sua instalação “O Homem de Aran” na Galeria Eduardo Fernandes, em São Paulo, as possibilidades atemporais de valorização de entidades que, no mundo da arte, possibilitam a conjugação das fases em um ou outro suporte. Da mobilidade no vídeo à mobilidade no fazer dos desenhos, esta soma de significados possíveis propicia, para o espectador, uma análise atualizada da realidade e seus personagens; seja a partir de uma perspectiva evolutiva ou de inércia social, de conformismo ou de ruptura. Com a instalação, Schutze estimula a criação de uma estrutura teórica que se vai elaborando a partir das constantes referências sugeridas: desde a fictícia caca do tubarão no filme até a representação pictórica bidimensional pelo artista brasileiro, o conjunto de imagens vai além do específico cinematográfico para se converter em leituras sociológicas com alcance e conotação maiores. A aparente reiteração dos signos pode apontar para zonas não superadas da dinâmica social e se transformar em pontos de partida de novos cenários. A sequência dos 64 desenhos do artista, intercalada com as imagens em movimento diminuídas do filme Os pescadores de Aran, 1934 de Robert J. Flaherty fragmentadas nos aparelhos de televisão que, ao mesmo tempo, se mostram em sequência contínua, apresenta-nos uma enciclopédia naturalista em suportes transcritos para as artes visuais, em uma relação ficcional (como no filme) e rotineira com relação ao suporte plástico que acompanha as projeções audiovisuais que, em ambas as cenas ficcionais, se entrelaçam. Neles, desenhos e vídeo, a reflexão sobre a vida dos artistas e sobre a própria vida. Flaherty e Schutze escrevem, em suportes plásticos, sugestões sutis inventadas para ser recriadas pelo receptor OUTRO, a partir do EU sugerido e/ou inventado, em parte ou no todo. Da imagem em movimento à imagem nos desenhos, a predominância da imagem, tanto estática quanto em movimento. O conjunto é impressionante pelo drama estrutural exposto, por sua combinação estética espetacular e pela edição concisa. Histórias simples, mas essenciais que, no tempo indefinido, emergem aqui como história única interrompida na representação e interpretação imposta a ser costurada, em sua sequência, em sutis e possíveis interrupções. Será autorreferencial? A proposta conseguirá fazer, do espectador, cúmplice de um compromisso de incidência social, quando intui (ou não) que os propósitos do sugerido são consequência de expressões complexas da realidade, suspeitando as incompreensões?
Andrés Hernández
São Paulo, verão de 2016.