COLETIVA | O OLHAR CRÍTICO - AFINIDADES [S]ELETIVAS
O Olhar Crítico | Exposição Coletiva
Proceder a uma seleção de trabalhos para uma mostra a partir de um conjunto de artistas pré-determinado, apesar de prática usual, incorre naturalmente em algumas limitações que arrefecem uma tônica mais autoral no exercício de uma curadoria. Por outro lado, o desafio de estabelecer articulações e buscar pontos de aproximação entre obras a partir de uma gama relativamente restrita de possibilidades não deixa de ser estimulante.
Isto posto, ao me defrontar com o time de artistas da Galeria Eduardo Fernandes - a partir do qual se definiu o recorte aqui apresentado -, optei por adotar uma linha de trabalho pautada menos no estabelecimento de um conceito ou mote central a priori que numa amostragem de obras que considerasse representativa de tal elenco. Tratou-se, portanto, de eleger algumas peças e apostar, escorando-se em alguma intuição e na subjetividade – esta indissociada do gosto pessoal, como sabemos -, numa conjunção de elementos que empreste algum sentido de unidade à produção escolhida, ao mesmo tempo em que não se desconsidera a singularidade intrínseca a cada produção. Deste modo, reuniu-se obras de artistas atuantes em plataformas poéticas, vertentes estilísticas e procedimentos diversos, compreendendo pinturas, desenhos, objetos, fotografias e vídeo.
Alguns conjuntos se conformaram espontaneamente a partir de aspectos comuns percebidos em produções díspares, como na tematização da natureza que aproxima, ainda que cheia de nuances, as imagens fotográficas de Alberto Lefévre, Renata Padovan, Ana Amélia Genioli e Vicente de Mello. Natureza que ora propicia um mote para as composições elegantemente despojadas realizadas por Alberto e Renata, insinuantes jogos visuais de escala ambígua, ora oferece-se como cenário que ambienta a ação/ensaio visual registrada por Ana; ou ainda, se impondo como assunto tradicionalmente caro à própria linguagem e tradição fotográficas, como em Vicente. 2 minutos, trabalho em vídeo de Padovan, convida a uma experiência intimista, quase hipnótica da temporalidade, em sua fatura despretensiosa, deliciosamente indolente.
As pinturas de Cristina Sá e Newman Schutze podem ser percebidas em certa medida como quase antitéticas: à expressividade mais sóbria, contida da produção recente de Newman, de "gestos cheios" mas controlados, com pequenos e espessos campos de cor procurando seu lugar sobre outro campo de cor - que calha de ser o suporte em estado bruto, o linho - se interpõe a quase-paisagem de Cristina, povoada por intervenções delicadas, colagens de forte senso gráfico e matizes ornamentais, em que formas-arabescos parecem flutuar sobre um mar de planos turvos.
Eduardo Climachauska insufla um pouco de ruído salutar ao todo com dois conjuntos escultóricos de presença intensa, desdobramentos de Esquerdo, instalação recente sua. De formalização algo imprecisa, e por isso mesmo instigante, aprumam-se a meio caminho entre o desenho e a vocação tridimensional que terminam por abraçar. Obra que encontra um interessante contraponto na assepsia cristalina do livro-objeto de vidro de Renata Barros, conceito e matéria conjugados sobre a transparência.
Na arte como na vida, muitas são as possibilidades de se detectar e consolidar afinidades, sejam elas de cunho afetivo, estético ou ideológico. E mesmo quando se recorre a um repertório mais "duro" ou específico para determiná-las, como se esboçou aqui, não deixa de consistir em um exercício prazeroso.
Guy Amado, Abril de 2007.